Como é que a Trade Republic ganha dinheiro?

A Trade Republic oferece juros com TANB de 2,75% no dinheiro não investido, comissões baixíssimas ou até inexistentes quando usamos planos automáticos, cashback nas despesas pagas com o cartão (incluindo no estrangeiro).

Tudo isto com a mesma garantia de qualquer banco português: a Trade Republic é na verdade um banco de investimento alemão (Trade Republic Bank GmbH), e é supervisionada pelo Banco Central Alemão e pelo BaFin (Autoridade Federal de Supervisão Financeira).

Como diz o ditado: “Quando a esmola é grande, o pobre desconfia.”

À medida que estas vantagens vão sendo apresentadas, em vez do entusiasmo, aumenta a desconfiança:

  • Como é que o meu banco não dá nada (até me cobra!!) e eles pagam juros no dinheiro parado, com a mesma garantia (proteção até 100k€) dos bancos portugueses?
  • Como é que conseguem cobrar zero pelas transações quando no meu banco custam 10€?
  • Como é que me dão 1% de cashback nas minhas contas enquanto aqui em Portugal tenho de pagar para ter cartão?
  • Se tudo é gratuito e ainda me dão todos estes benefícios, como é que ganham dinheiro?

São tudo perguntas válidas. E quando estamos habituados à realidade portuguesa, em que os bancos lucram milhões com o nosso dinheiro, é mesmo difícil imaginar uma realidade em que isto seja possível.

Vamos então ver de que forma é que a Trade Republic ganha dinheiro?

Não é com custos escondidos

Não estou a responder à verdadeira questão (ainda), mas achei importante esclarecer isto 🤪

A Trade Republic disponibiliza um relatórios de custos que, aparentemente, inclui custos extra que não nos são apresentados inicialmente e muitas pessoas acham que a comissão baixa de 1€ é disfarçada entre várias dezenas de euros escondidos e apresentados neste papelinho difícil de encontrar.

Estes tais custos totais podem ser consultados no documento “informações de custo”, que pode inclusive ser visto antes de avançar com a compra.

Aqui podemos ver o resumo de todos os custos associados a este investimento, incluindo:

  • Custos externos de compra: comissão de 1€ que é cobrada em cada transação, independentemente do valor da compra;
  • Custos anuais: TER do próprio ETF, não tem nada a ver com a corretora;
  • Custos externos de venda: comissão de 1€ que será paga no momento em que vendermos este ETF.

Depois podemos ver, em cima, o resumo dos custos no primeiro ano, anos do meio, e último ano (inclui comissões de compra e venda e a TER anual do ETF).

Abaixo é apresentado um resumo de custos para 5 anos de portefólio na carteira:

  • Custos de serviço (custo de transação, compra e venda): 1+1 = 2€
  • Custos do produto (TER): 0,22% *1000€ * 5 anos = 11€
  • Third-party grants: um valor que a Trade Republic pode receber por efetuar esta transação, neste caso é zero (se não for zero, é uma fonte de rendimento);
  • Custo total: 2+11+0=13€

Na prática o que eles nos apresentam aqui é um resumo dos custos que nós já sabemos que vamos ter com este ETF: comissões na compra na venda e comissões de gestão do próprio ETF enquanto o tivermos.

Também não é com empréstimo de ativos

Continua a não responder à questão, mas também é importante clarificar: a Trade Republic não empresta os nossos ativos (informação na FAQ)

Third party grants

Estas são basicamente comissões recebidas por entidades externas. Como vimos no exemplo anterior, esta fonte de rendimento não ocorre em todas as transações. Caso apareça no teu resumo de custos, é uma fonte de rendimento para a corretora, e não um custo para ti.

PFOF – Payment for order flow

Este modelo, conhecido como pagamento por fluxo de ordens (PFOF), permite que as corretoras operem sem cobrar comissões diretas dos clientes. Neste caso, as corretoras recebem pagamentos de empresas de “market making” para direcionar as ordens dos seus clientes para essas mesmas empresas.

Os market makers ganham dinheiro executando as ordens a preços aos preços superiores de compra possíveis, e em troca, partilham parte desse lucro com a corretora que direcionou a ordem. Embora este modelo beneficie a corretora e o market maker, pode gerar preocupações quanto à qualidade da execução das ordens, uma vez que os investidores podem não obter sempre o melhor preço disponível no mercado. Provavelmente por este motivo, na UE o PFOF será proibido a partir de 2026.

Este é um modelo de transação usado por algumas corretoras low cost para permitir custos mais baixos de transação. No caso da Trade Republic, os ativos são transacionados na LS exchange mas os spreads são os da bolsa XETRA.

Antes que digas… “ahhh, eu sabia que estava a perder dinheiro!”, deixa-me dizer-te que há formas de reduzir este potencial problema:

Se colocarmos as ordens de compra ou venda no horário em que a bolsa XETRA está aberta (9:00 – 17:30 CET, ou seja, 8:00-16:30 em Portugal), evitamos pagar preços superiores aos necessários. Da mesma forma, se compramos ações americanas, faz sentido comprar entre as 14:30 e as 16:30, porque a essa hora as bolsas americanas e a XETRA estarão ambas abertas.

Depois das 17:30 encontrei diferenças de 0,08€ no VWCE, mas também de 0,06€. Mesmo fora de horas as diferenças não são assim tão significativas. Num investimento em 10 UP – ~1380€ – pagaríamos 0,80€ a mais por esta diferença bid/ask.

Os planos de investimento são sempre executados no horário de funcionamento da bolsa, por isso não há grandes perdas nestes casos também.

Deixo aqui um estudo detalhado sobre PFOF feito pelo BaFIN (autoridade responsável pela fiscalização e supervisão na Alemanha), para quem tiver interesse.

Pagamentos de fornecedores de ETF

Fornecedores de ETF como Vanguard, BlackRock, Amundi, etc pagam uma comissão à Trade Republic por cada ativo transacionado lá.

Este não é um custo para o cliente, uma vez que é pago diretamente pelo fornecedor à corretora.

Derivados e criptomoedas

Não me quero alongar neste tipo de produtos complexos (estão bem fora da minha filosofia de investimento e conhecimentos), mas não podia deixar de os referir aqui: derivados, CFD e afins são uma boa fonte de rendimento para as corretoras.

No caso das criptomoedas, na Trade Republic o spread é bastante alto: 0,8% por transação. Com milhares de transações diárias, 0,80% pode ser bem significativo (mesmo que não o seja para cada investidor de forma individual).

Pagamentos com cartão

A Trade Republic recebe 0,3% de cada pagamento feito com o seu cartão, pago pela VISA. OK, mas… de onde vêm os restantes 0,7% para pagar o saveback que nos dão?

Estes 1% têm de ser aplicados num plano de poupança que, como vimos, também gera rendimentos para a Trade Republic. Mesmo que o que ganham desta forma não seja suficiente para cobrir os 15€ que oferecem no máximo por mês, acabam por ser um bom investimento em marketing: muitas pessoas abrem conta na Trade Republic precisamente por todas estas vantagens para os investidores.

Conversão de moeda

Isto é irrelevante caso se invista sempre em euros. Quando se adiciona outras moedas à carteira, há um pequeno spread que é cobrado pela corretora para fazer o câmbio.

Conclusão

A Trade Republic consegue oferecer condições fantásticas as seus utilizadores: repasse total do juro estipulado pelo BCE, cashback nas despesas e planos de investimento gratuitos.

Para conseguir fundos para pagar tudo isto e ainda serem lucrativos, contam com várias fontes de receita:

  • Juros do BCE: recebem estes juros e repassam-nos na totalidade para os utilizadores;
  • Third -party grants: alguns fornecedores pagam por transação (é possível ver se esta comissão existiu no extrato de custos);
  • PFOF: o modelo de negociação permite receber um pequeno spread em cada transação. Como vimos, o custo para nós é reduzido caso as transações sejam feitas no horário de funcionamento da bolsa XETRA;
  • Pagamentos de fornecedores de ETF: seja por disponibilizarem o ETF, por o colocarem mais acima na lista quando fazemos uma pesquisa… Há fornecedores que pagam estes serviços à Trade Republic;
  • Derivados: há taxas superiores em produtos complexos e alavancados (não são para mim, por isso não sou eu que os pago);
  • Criptomoedas: o spread é alto, cerca de 0,80% no caso da Bitcoin;
  • Pagamentos com cartão: a rede VISA paga uma comissão à Trade Republic por cada transação que é feita com os seus cartões;
  • Conversão de moeda: quando se compra ativos noutras moedas, há um spread aplicado à conversão que ronda os 0,1% (mais uma vez, compro sempre em euros por isso os custos não são comigo).

Há formas de as empresas ganharem dinheiro que nós nem sonhamos. Nós estamos tão mal impressionados com os bancos portugueses (que assumem a taxa do BCE como lucro interno e não repassam coisa nenhuma), que depois vemos casos destes e achamos que tem de ser bom de mais para ser verdade.

Espero que este artigo tenha ajudado a desmistificar isso.

Ajudou?

Disclaimer: A autora do blog Dama de Ouros não fornece recomendações ou aconselhamento financeiro. Todo o conteúdo presente neste blog tem apenas fins informativos e educacionais, sendo qualquer decisão de investimento da responsabilidade do leitor.

Todos os investimentos têm risco. Resultados passados não são garantia de rentabilidades futuras. Faz sempre a tua própria análise antes de fazer qualquer investimento.

Este artigo foi patrocinado pela Trade Republic.

7 thoughts on “Como é que a Trade Republic ganha dinheiro?

  1. Feito! E contactei a Degiro para transferir a minha carteira, é possível e está em curso. Não gosto de ter muitas plataformas/contas em sítios diferentes, e a TR também me inspira mais confiança nos ETFs.

  2. Olá,

    Pela tua experiência sabe me dizer entre a trading republic e as trading 212 qual é a melhor?

    Qual dos ativos que cada uma está mais direcionada?

  3. Olá,
    Pela tua experiência sabe me dizer entre a trading republic e as trading 212 qual é a melhor.

    Qual dos ativos que cada uma está mais direcionada?

    1. Olá!

      Não tenho experiência com a Trading212, nunca tive lá conta.
      Inicialmente não permitiam a transferência de ativos para outras corretoras, e foi logo fator de exclusão para mim. Agora já permitem, mas estou satisfeita com as que tenho de momento

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *