Em fevereiro de 1998, Philip L. Cooley, Carl M. Hubbard e Daniel T. Walz, professores na Universidade Trinity no Texas, publicaram artigo “Retirement Spending: Choosing a Sustainable Withdrawal Rate”, conhecido mundialmente como o Trinity Study.
Este estudo teve como objetivo determinar a percentagem do portefólio que poderia ser gasta de forma sustentável numa reforma tradicional, para garantir que o dinheiro não acabaria, com base em dados históricos de retornos dos mercados e da inflação nos EUA.
A conclusão do Trinity Study foi: para um portefólio investido na bolsa de valores com uma determinada percentagem de ações e obrigações, é possível retirar anualmente 4% do valor acumulado (ajustado à inflação), com 95% de taxa de sucesso num período de 30 anos.
Há três variáveis que afetam a probabilidade de os ativos acumulados serem suficientes para a reforma planeada:
- Tempo na reforma;
- Distribuição do portefólio;
- Taxa de utilização do portefólio inicial.
A regra ainda é válida? E se quiser a reforma antecipada?
O Trinity Study, realizado com valores de 1926 a 1995, foi entretanto atualizado com valores até 2014 e para períodos mais longos de reforma.
As tabelas seguintes apresentam a probabilidade de sucesso de diferentes taxas de utilização do valor acumulado, para diferentes alocações de portefólio (percentagem em ações usando um fundo que replique o índice S&P500 e percentagem de obrigações usando obrigações governamentais americanas de 20 anos).
Todos os valores são baseados em resultados reais de inflação e retornos, entre 1926 e 2014.
Taxa de utilização do portefólio | 100% Obrigações | 75% Obrigações 25 % Ações | 50% Obrigações 50 % Ações | 25% Obrigações 75 % Ações | 100 % Ações |
---|---|---|---|---|---|
3% | 100% | 100% | 100% | 100% | 100% |
4% | 94% | 100% | 100% | 100% | 100% |
5% | 76% | 94% | 99% | 94% | 91% |
Taxa de utilização do portefólio | 100% Obrigações | 75% Obrigações 25 % Ações | 50% Obrigações 50 % Ações | 25% Obrigações 75 % Ações | 100 % Ações |
---|---|---|---|---|---|
3% | 82% | 100% | 100% | 100% | 100% |
4% | 42% | 87% | 100% | 98% | 93% |
5% | 18% | 42% | 68% | 77% | 77% |
Taxa de utilização do portefólio | 100% Obrigações | 75% Obrigações 25 % Ações | 50% Obrigações 50 % Ações | 25% Obrigações 75 % Ações | 100 % Ações |
---|---|---|---|---|---|
3% | 60% | 98% | 100% | 100% | 100% |
4% | 6% | 42% | 86% | 92% | 88% |
5% | 0% | 6% | 42% | 64% | 68% |
No caso do FIRE, com a reforma antecipada, podemos ter 40, 50 ou até mesmo 60 anos de vida sem rendimentos “normais”, nos quais dependeremos exclusivamente dos ativos acumulados.
Análise dos dados para reforma de 40 anos
- A probabilidade máxima de sucesso (92%) para o período mais longo de reforma analisado, considerando a taxa de 4% utilização do portefólio usada como regra para os cálculos FIRE, ocorre para uma distribuição de 25% em obrigações e 75% em ações;
- Mantendo a regra dos 4%, a probabilidade de sucesso diminui para um portefólio de 100% em ações (88%);
- A probabilidade de sucesso é ainda inferior para portefólios mais conservadores: optando por 75% obrigações e 25% ações (como é muitas vezes recomendado para aumentar a segurança e reduzir volatilidade) a probabilidade de sucesso reduz drasticamente para 42%!
- Num portefólio constituído apenas por obrigações, com a taxa de 4%, a probabilidade de sucesso é de apenas 6%;
- Para uma taxa de utilização do portefólio de 3%, para um portefólio com um mínimo de 50% em ações, a probabilidade de sucesso é de 100%.
Porque não optar por uma taxa de 3%?
No meu caso, para despesas mensais de 1000 €, os valores necessários para atingir o FIRE são:
- 300.000 € para uma taxa de 4%
- 400.000 € para uma taxa de 3%

Vê neste artigo como calcular.
Considerando um retorno de 7% nos investimentos e mantendo o valor de investimento atual, consigo atingir o FIRE em 2031 com taxa de 4% e em 2034 com taxa de 3%.
É uma diferença de 3 anos. Mais 3 anos de trabalho por 100% de probabilidades de sucesso vs. 92%, vale a pena arriscar? Espera, arriscar o tempo ou arriscar falhar?
Nesta fase não sei sequer se quando lá chegar irei continuar a ganhar dinheiro de alguma forma ou se abandonarei o trabalho remunerado por completo. Independentemente disso, tenho uma certeza: considerar-me-ei financeiramente independente quando puder retirar 4% do portefólio, porque 92% uma probabilidade de sucesso boa que chegue para mim.
E se eu fizer parte dos 8% que falham?
Ouvi uma frase na entrevista do Joel do blog FI180 no episódio 11 do Podcast Bigger Pockets Money que me marcou bastante:
“Your worst case scenario is everybody else’s everyday life.”
Joel, FI180
A pior coisa que pode acontecer se o plano falhar é ter de voltar a trabalhar por dinheiro. Relembro que esta seria a única solução se o plano para o FIRE não existisse!
E tu?
Preferes o tempo e risco da regra dos 4% ou a segurança da regra dos 3%?
BONS INVESTIMENTOS!
Disclaimer: A autora do blog Dama de Ouros não fornece recomendações ou aconselhamento financeiro. todo o conteúdo presente neste blog tem apenas fins informativos e educacionais, sendo qualquer decisão de investimento da responsabilidade do leitor.
Muito bom!! Ao ler os teus artigos lembro-me muito dos discursos do Pepe Mujica (ex. presidente do Uruguay) com a relação que temos com o dinheiro e a definição de riqueza não sei se conheces, caso não conheças recomendo que vejas.
Muito obrigado por todas as partilhas
Olha, não conheço mas vou já espreitar! Muito obrigado pelo comentário e pela partilha 😃
Olá Dama! Eu sei que escreveste este post há imenso tempo, mas como só agora descobri o teu blog, só agora estou a ler os posts, desde o início.
Eu estou a caminho do Fat Fire e optei por uma estratégia diferente. Tenho tudo investido em acções que pagam dividendos, e estou a apontar para uma verba mensal que cubra.2 x as minhas despesas mensais. Em vez de ter de vender títulos para pagar despesas, que numa situação extrema, de quedas até 50% afetaria o total máximo a retirar, opto por receber os dividendos líquidos de impostos, sem ter de me preocupar com as variações do mercado.
De QQ modo, entre 92% e 100% optaria pelos 100% (withdraw de 3%). Tanto tempo a planear algo e depois teres de voltar atrás nos planos ao fim de não sei quantos anos fora do mercado de trabalho nao me parece muito agradável!
Olá!
Eu tenho uma estratégia de proteção mais ou menos delineada para evitar fazer parte dos 8% que correm mal. Honestamente, aumentar o tempo para o FIRE em 3 anos não me apela minimamente!
Claro que posso planear tudo e ter azar na mesma, mas é um risco que estou disposta a correr.
Vê aqui a estratégia que terei. É muito semelhante ao que descreves: utilizar os dividendos/juros para não ter de vender 4% do portefólio total todos os anos.
https://www.damadeouros.com/fire-pessimista/
Fiquei curiosa com uma questão: como é que recebes dividendos líquidos de impostos?
Bom dia Dama,
descobri agora o teu blog e estou a adorar.
Sou muito nova neste mundo das poupanças e investimentos, mas em relação a esta regra dos 4%, não estarás a ter em conta a inflação?
Li este post do doutor finanças: https://www.doutorfinancas.pt/financas-pessoais/regra-dos-4-ainda-faz-sentido-nos-dias-de-hoje/
E diz que hoje em dia o que fazia sentido era mais uma regra de 5%. O que achas?
Olá!
Uma regra de 5% seria ainda mais arriscada, porque estaríamos a retirar ainda mais dinheiro do portefólio inicial.
Como podes ver neste artigo, 5% tem bem menos probabilidades de sucesso.
A regra dos 4% e os estudos que foram conduzidos nessa área têm em consideração a inflação. Ou seja, essas tais probabilidades de sucesso já são a ter em conta que todos os anos se ajusta o valor retirado à inflação.
A inflação existiu sempre e sempre existirá, não é propriamente algo que nunca tenha acontecido, por isso já foi pensado aí também 🙂