FIRE Flamingo: Expectativa vs. Realidade da minha semi-reforma

Gosto muito de segurança, de planear, de fazer previsões. Não gosto de incerteza nem de pressão desnecessária. Por isso, todas as decisões importantes da minha vida são tomadas depois de muita análise e ponderação, e com planos B, C e D traçados, para implementar caso o A não corra bem.

Planeei e sonhei bastante com o FIRE Flamingo, nesta nova fase da minha vida em semi-reforma. Neste artigo, partilho a comparação entre a expectativa e a realidade do FIRE Flamingo, seis meses após dar esse passo.

Expectativas antes do FIRE Flamingo

No segundo semestre de 2024, quando estava a avaliar a hipótese de me despedir do meu emprego como engenheira, refleti bastante e fiz todos os cálculos que me pareceram importantes para dar este passo para o FIRE Flamingo com segurança.

Calculei as minhas despesas

Coloquei em papel todas as despesas fixas essenciais. De quanto dinheiro preciso para pagar a renda, luz, água, seguros e comida? Qual o custo das minhas deslocações e da prática de desporto?

Somei todos os essenciais, para saber o valor de que realmente preciso para viver. A minha liberdade e a transição de carreira para uma que me satisfaz mais eram mais importantes que qualquer extra que pudesse ter. Viajar é giro e jantar fora de vez em quando sabe bem, mas nada que se compare a acordar e saber que o dia é meu para o viver como quiser.

Lean vs. fat FIRE

Cada vez mais vejo pessoas focarem-se no fat FIRE, para terem mais e melhor. Está tudo certo com isso, mas essa nunca foi a minha abordagem. Sempre preferi controlar as despesas e mantê-las baixas, com flexibilidade para reduzir ainda mais se necessário, e antecipar o FIRE, do que trabalhar mais anos para poder aumentar o nível de consumo.

Eu sei que há um limite no corte das despesas e que, por outro lado, o aumento de rendimentos é infinito. Podemos sempre ganhar mais, não podemos sempre gastar menos.

  • Quanto menos gastarmos, maior a nossa taxa de poupança e mais rápido acumularemos capital;
  • Quanto menos gastarmos, menor o valor necessário para atingir o FIRE.

Não só conseguimos acumular mais, como precisamos de acumular menos.

Isto torna-se ainda mais poderoso quando ambicionamos alguma espécie de FIRE híbrido. Quando falamos do FIRE Flamingo, em que a partir de uma determinada altura só temos de trabalhar para cobrir as despesas (e podemos parar de poupar), quanto mais baixas forem essas nossas despesas, menor o nosso risco:

  • Se as minhas despesas são de 2000€ por mês e vou viver o FIRE Flamingo, tenho de gerar rendimentos que cubram esses 2000€ por mês. Não é qualquer trabalho por conta de outrem ou qualquer renda extra que gera esse valor;
  • Por outro lado, se as minhas despesas são de 900€ por mês, QUALQUER trabalho garante que as consigo pagar. O salário mínimo nacional chega.

Obviamente, o sonho não é trocar uma profissão da qual gostava por qualquer emprego de salário mínimo. Mas a verdade é que retira muita pressão saber que qualquer trabalho serve para o efeito.

Defini os inegociáveis para dormir bem de noite

Aquelas loucuras de sair para uma volta ao mundo com 100 euros no bolso não são para mim. Admiração por quem o faz, porque somos sem dúvida feitos de matéria diferente! 😅

O objetivo de me despedir era ter mais liberdade, mais tranquilidade, mais tempo para estar com a minha família, maior disponibilidade para expandir uma nova carreira. Só consigo aproveitar tudo isso se souber que as minhas finanças estão controladas e que é uma decisão sustentável. Para mim, estar segura deste passo envolveu:

  • ter 150 mil euros investidos, isto é, ter atingido o FIRE Flamingo;
  • ter uma “prova de conceito”, ou seja, ter um histórico que me mostrasse que a minha renda extra poderia cobrir as minhas despesas;
  • ter rendimentos passivos que me cobrissem parte das despesas, caso os rendimentos ativos estivessem em baixa;
  • ter uma almofadinha, ou fundo de emergência, de 12 meses.

O trabalho por conta própria não é para todos. Não há um dia certo para receber o salário, não há subsídios de férias e natal e há muito maior responsabilidade na gestão financeira para garantir que se guarda o suficiente para cobrir todas as despesas fiscais envolvidas (IRS, IVA, SS). Pode ser mais incerto e mais inconstante. Eu nunca teria sido capaz de dar o passo sem salvaguardar os pontos anteriormente descritos.

Fiz check em todos os pontos e, no dia 1 de janeiro de 2025, comecei esta nova aventura.

Realidade do FIRE Flamingo

Seis meses depois, percebo que fui extremamente pessimista e bastante conservadora no meu planeamento. Não me arrependo de nada, porque foi o plano que tracei que me deu a segurança e coragem para avançar, mas há ajustes a serem feitos nos próximos tempos para refletir a realidade desta nova fase.

Almofada financeira: 12 meses é demais

Este primeiro ano seria uma descoberta total. Não fazia ideia do que iria sentir, do que me iria apetecer fazer, de como as coisas iriam correr. Partilhei algumas vezes o medo que tinha de, ao transformar um hobby num trabalho, perder o prazer e o entusiasmo de o fazer. Quis uma almofada de 12 meses, para me permitir um ano sabático, se necessário, para redescobrir o que iria fazer daqui para a frente se as coisas não estivessem a correr como o esperado.

As conclusões destes primeiros seis meses? Continuo a adorar escrever. Tenho experimentado fazer vídeos, algo que nunca tinha explorado. Sinto que gosto ainda mais de tudo isto agora, porque tenho todo o tempo e criatividade necessários, sem o cansaço e a exigência que tinha com o trabalho de engenharia.

Com mais tempo livre, posso trabalhar mais em atividades que me geram rendimentos sem grande esforço. Não porque não dão trabalho, mas porque me entusiasmam e porque, para mim, é tempo bem passado! Com mais horas e mais intencionalidade, consegui multiplicar significativamente os rendimentos.

Isto significa que uma almofada de 12 meses é, nesta fase, um grande desperdício. Há um custo de oportunidade de todo o dinheiro que não está investido em ativos com potencial de crescimento, e o benefício que estou a retirar deste fundo de emergência é reduzido.

Solução? Passá-la para 6 meses de despesas, isto é, 6000€.

Rendimentos ≠ Despesas

Fiz o plano a achar que os rendimentos seriam diferentes das despesas. Almofada e escudo de retornos preparados para me proteger.

Acontece que os rendimentos têm sido, de facto, diferentes das despesas, mas no sentido oposto ao esperado. Tenho conseguido poupar praticamente todos os meses.

Estou, por isso, a fazer duas coisas que não estavam contempladas no plano:

  • muitas viagens. Imensas viagens.
  • continuar a investir.

Tinha um orçamento de 3000 euros para viagens, como tem acontecido nos últimos anos. Ainda só estamos em junho e já gastei: ~700€ numa viagem à Alsácia, em fevereiro, ~2000€ numa viagem aos EUA, em abril, e ~1600€ num interrail, agora em maio e junho.

Viveria bem limitando-me ao orçamento estipulado? Sem dúvida. Se prefiro gastar mais já que os objetivos estão salvaguardados e tenho essa possibilidade? Com certeza.

Tenho também investido todas as poupanças que vou tendo. Para salvaguardar a segurança, da qual continuo a gostar muito, estou a direcionar todas as poupanças para ativos distributivos, entre P2P e ETF de distribuição. Desta forma tenho o dinheiro alocado a ativos que aumentam o meu escudo de proteção.

Não sei como será o futuro e se os rendimentos continuarão a superar as despesas. O que sei é: quanto maior o volume de renda passiva que receber daqui em diante, menor a pressão sobre os rendimentos ativos e maior a liberdade financeira.

Disponibilidade = Oportunidades

Algo que não contemplei no plano e que não esperava que me fosse surpreender desta forma foi a quantidade de oportunidades que surgem quando passamos a estar disponíveis.

Avisei que me ia despedir no círculo profissional? Recebi imensas propostas de outras empresas, para trabalhar em engenharia, fosse a tempo inteiro ou como freelancer em projetos pontuais.

Disse aos meus amigos e familiares que agora ia passar a trabalhar por conta própria? Choveram ideias de negócio em que eu poderia ajudar, agora que tinha tempo e disponibilidade.

Mostrei-me mais disponível para aceitar trabalhos dentro do blog, por ter mais tempo para lhes dedicar? As oportunidades multiplicaram-se, e continuam a aparecer novas todos os dias.

Ainda não aceitei grande parte de todas as propostas interessantes que me fizeram, por um motivo: estive dedicada a terminar um livro. A partir de agora, veremos o que irá acontecer 🙌🔥

Conclusão: flexibilidade é liberdade

Seis meses depois, a realidade confirmou ser diferente da expectativa e já adaptei o plano em conformidade. Nesta jornada, mais importante do que acertar e adivinhar tudo, é estar preparado para fazer as alterações necessárias, sempre que fizer sentido.

Números à parte, está a ser incrível! 🔥

Há algo na tua vida financeira que tenha corrido totalmente diferente da expectativa planeada?

Disclaimer: A autora do blog Dama de Ouros não fornece recomendações ou aconselhamento financeiro. Todo o conteúdo presente neste blog tem apenas fins informativos e educacionais, sendo qualquer decisão de investimento da responsabilidade do leitor.

4 thoughts on “FIRE Flamingo: Expectativa vs. Realidade da minha semi-reforma

  1. Que espectáculo! És uma inspiração. E é melhor teres feito o plano contando com o pior cenário, agora ajustando-o para uma realidade que se revelou melhor que o esperado, do que o contrário! 🙂

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *