Se ganhasse 1 € cada vez que me perguntam isto, o FIRE seria bem mais cedo 🤪
Atenção, esta dúvida é perfeitamente legítima! É claro que é importante planear para todas as eventualidades. No entanto, deixar o medo paralisar-nos e impedir-nos de avançar é o pior que podemos fazer ao nosso “eu” do futuro.
Como as evidências demonstram, houve casos em que a regra dos 4% falhou no passado (vê este artigo). Considerando o facto de desempenhos passados não implicarem resultados semelhantes no futuro, ainda mais incerteza é adicionada à equação!
Antes de mais, é crucial entender que a nossa situação vai mudar ao longo do tempo (podemos ter maiores custos com saúde, acabar de pagar o empréstimo da casa ou receber uma herança) e os mercados também. Por isso, é importante rever e monitorizar continuamente o plano e ajustar os valores ao longo do caminho para responder aos aumentos ou reduções nas despesas. A alocação de ativos no portefólio também pode ser ajustada em função das condições do mercado e de preferências pessoais.
O meu valor FIRE
Em 2020, as minhas despesas anuais foram 9.800 €. Destas despesas, 1.200 € foram associadas ao trabalho, pelo que as irei excluir dos cálculos.
Uma vez que pretendo viajar mais e que terei de pagar impostos sobre as mais-valias obtidas, considero então um valor de 12.000 € para despesas anuais na vida pós-FIRE. Este valor é já bastante inflacionado, uma vez que é 40% superior ao valor que gasto atualmente (excluindo despesas com o trabalho).
Usando a regra dos 4% posso então considerar que o meu Lean FIRE, valor que necessito para suprir as minhas despesas atuais, é de 215.000 € . O valor que normalmente apresento – 300.000 € – é já para mim um Fat FIRE, uma vez que inclui despesas que não tenho atualmente, num aumento de quase 40% face ao valor atual.
Quando vou atingir o FIRE
Quando traçamos objetivos a longo prazo que não dependem exclusivamente de nós e do nosso esforço, o melhor que podemos fazer é uma estimativa de cálculo com valores assumidos baseados em dados históricos. No caminho para o FIRE há dois elementos cruciais que desconhecemos e temos de tentar prever:
- As nossas despesas daqui a 10, 20 ou 30 anos;
- Os retornos dos nossos investimentos no futuro
As despesas futuras a considerar dependem muito do que planeamos para a nossa vida. Se queremos ter filhos, se queremos viajar mais, se temos problemas genéticos de saúde na família, se queremos ir viver para outro lugar, se a inflação será diferente dos valores médios históricos. É difícil prever despesas num período tão longínquo, quando as nossas vontades e circunstâncias estão em constante mutação.
Além disso, temos de considerar um valor para o retorno do nosso portefólio. Nos últimos 100 anos a média da bolsa de valores foi uma, mas será que nos próximos será a mesma? Pode ser igual, pode ser mais baixa ou até mais alta. Ninguém consegue prever o que pode acontecer, por isso o melhor que podemos fazer é confiar no que tem acontecido até ao momento.
Nos meus cálculos considero um aumento de 40% nas despesas anuais e uma taxa de retorno dos meus investimentos de 7%.
Com base nestas informações, o meu FIRE chegará em 2031, com 38 anos.
Estratégias de proteção
Mas então e se em 2031 houver uma grande crise como tantas outras que já existiram (e continuarão a existir)?
Mesmo que não haja uma crise na data do FIRE, para uma reforma com duração de 40 anos e taxa de utilização de 4%, a taxa de sucesso para um portefólio de 25% obrigações e 75% em ações é de 92%. Isto significa que em 8% dos casos o dinheiro acabaria antes do suposto! Ninguém quer fazer parte dos 8% de insucesso, pois não?
As alternativas seriam então: utilizar uma taxa de utilização do portefólio de 3% (taxa de sucesso de 100% para a mesma divisão de portefólio mas bastante mais acumulação de capital necessária e, consequentemente, mais anos de trabalho) ou usar a estratégia de proteção que vou apresentar de seguida.
No meu caso específico, passar de uma taxa de utilização de 4% para 3% (400.000 € em vez de 300.000 €) implica 3 anos extra para atingir o FIRE, o que não é grande vitória.
Em vez disto, o meu plano passa por manter a regra dos 4% e utilizar as estratégias apresentadas no livro Quit Like a Millionnaire – Cash cushion e Yield Shield.
Se já leste o livro, este plano vai soar-te familiar. É perfeito e vou adoptá-lo na minha jornada, sem sombra de dúvida!
Yield Shield – Escudo de Retornos
Se tivermos um portefólio 100% alocado a ETFs acumulativos durante a reforma antecipada, a nossa fonte de rendimento está completamente indexada aos valores da bolsa de valores. Ou seja, quando a bolsa está em alta não há qualquer problema, no entanto em alturas de um bear market somos obrigados a vender mais posições a preços baixos.
O método Yield Shield propõe ter uma parte do portefólio alocada a ativos que gerem uma renda periódica. Assim, independentemente do valor das unidades de participação, temos um fluxo mais ou menos fixo (apesar de variar, as oscilações são pequenas).
Em alturas de bear markets, as oscilações nos dividendos distribuídos são pouco significativas. Já o valor de cada ação ou unidade de participação num ETF pode sofrer quedas abruptas.
Exemplo de ativos que permitem rendimentos periódicos:
- Obrigações
- ETFs de ações distributivos
- REITS
Se optarmos por ter, por exemplo, 40% do nosso portefólio em ativos distributivos com uma taxa de retorno anual de 3,5%, conseguimos cobrir 35% das nossas despesas anuais mesmo que o mercado esteja em baixa, sem ter de tocar no valor investido.
Exemplo para o meu valor:
Valor em ativos distributivos = 40% x 300.000 € = 120.000 €
Yield Shield = 120.000 € x 3,5% = 4.200 €/ano
4.200 € estão cobertos pelo Yield Shield. Isto significa que só teria de vender por exemplo ETFs acumulativos no valor de 7.800 €/ano.
Cash cushion – Almofadinha
Analisando os casos de insucesso da regra dos 4%, conclui-se que praticamente todos ocorreram quando a reforma ocorre imediatamente antes de uma crise. Isto é, quando no início da utilização dos investimentos há uma queda na bolsa que obriga à venda das posições a preços desfavoráveis. Este fenómeno é conhecido como sequence of return risk e é isso que esta almofadinha permite prevenir.
As crises sempre existiram e sempre irão existir. Dado o histórico existente até ao momento, o tempo máximo de recuperação de uma queda ronda os 5 anos.
Para contrariar a falha do plano nos anos iniciais, a solução passa por manter em dinheiro e/ou ativos de baixo risco o equivalente a 5 anos de despesas. Desta forma, nunca seremos obrigados a vender posições em quedas significativas de mercado.
No meu caso, com 9.000 € de despesas anuais, precisaria de acumular de 45.000 € em dinheiro para garantir que não seria obrigada a vender posições caso o mercado esteja em queda durante 5 anos.
45.000 € é um valor enorme!
A boa notícia é que graças ao escudo de retornos apresentado anteriormente, este cash cushion não precisa de ser assim tão elevado. Isto porque podes retirar o valor do escudo das despesas anuais, já que é um rendimento que não é afetado significativamente mesmo em alturas de crise.
O valor da almofadinha é então igual a:
Almofadinha = (Despesas anuais – Escudo) x 5
Este valor será então o fundo de emergência para o FIRE, correspondente a 5 anos de despesas. Poderá estar guardado nos mesmos locais em que guardamos o FE neste momento
Exemplo para o meu valor:
Almofadinha = (9.000 € – 4.200 €) x 5 = 24.000 €
Conclusão
A regra dos 4% deve ser usada como ponto de partida e adaptada à nossa tolerância ao risco, estado da economia e planos para o futuro.
O meu plano FIRE passa por:
- Acumular o valor FIRE pela regra dos 4% – 300.000 €
- Ter 40% do portefólio alocado a ativos que distribuam dividendos/juros periodicamente
- Construir uma almofadinha de 5 anos de despesas básicas – 24.000 €
O que achaste desta estratégia? Partilha comigo a tua!
BONS INVESTIMENTOS!
Ola !
Perante a estratégia 75/25 accões/obrigações e a necessidade de 40% de activos distributivos (sendo que 25 das obrigações já o são mas com taxas muito baixas de retorno e a prever-se manutenção para os próximos 10 anos) que estratégia apresentarias ?
15% em ETF distributivo ou “roubar” 15% às acções e aplicar em REITs ?
A taxa de sucesso manter-se-ia, visto que a regra foi feita com 75% – 25%.
Olá Dama de Ouros 🙂
Uma questão, o portfólio com 40% de ativos distributivos deve ser elaborado logo desde início? Ou só no final quando se tiver chegado ao valor Fire é que alocamos esses 40% nesses ativos? Qual é o teu plano? Obrigada 🙂
Olá!
Neste momento já tenho uma parte do portefólio que me paga juros: as plataformas P2P.
Vou continuar a reforçar apenas ETFs acumulativos nos próximos anos. Apenas mais próximo da data passarei a comprar ETFs distributivos, par optimizar ao máximo a questão fiscal 🙂
Olá,
Adorei até agora todos os posts e este acho extremamente importante porque esta estratégia dá conforto nesta jornada e será importante para prevenir quebras.
Muito bom mesmo.
Falo por mim, já tinha andado a calcular o FIRE mas nem sabia disto e como eu deve de haver muitos (espero que não).
Cumprimentos
Olá Luís!
Obrigada pelo feedback 😀
Acho que convém ter planos A, B e até C para não haver stress na jornada.
Se não estivermos devidamente preparados para todas as eventualidades acabamos por ter constantemente preocupações que podem facilmente ser evitadas 🙂